No dia 10 de fevereiro
passado o Partido dos Trabalhadores completou 35 anos de existência
formal. Na informalidade, começa com o Movimento Pró-PT, em 1978,
por dentro de uma intensa movimentação de trabalhadores(as) de
diferentes categorias e regiões, sendo núcleo principal o ABCD
paulista, maior concentração operária do país. O anúncio do
projeto se deu na Reunião Intersindical de Porto Alegre, RS, em
19-01-79.
Portanto, o PT não
surge dos gabinetes executivos ou legislativos, nem de geração
espontânea, muito menos de cima para baixo. Surge no seio de lutas
importantes de parcela significativa do povo brasileiro que lutava
não só contra a Ditadura mas por Terra, Trabalho, Liberdade e o
direito de ser sujeito e não objeto da política. O Partido, já nos
seus primeiros documentos, forjados nas discussões por núcleos de
trabalho, moradia, estudo, lazer, etc, enfatizava a importância da
Política não como “o toma lá dá cá” dos partidos
tradicionais, mas como a construção de uma nova sociedade com o
protagonismo das pessoas. Os debates foram se espraiando e se
aprofundando.
Incorpararam-se a esse
movimento inicial outras vertentes e experiências de lutas sociais
diversas, do pensamento libertário e do socialismo democrático,
latentes nas lutas do povo brasileiro. O Programa do Partido foi
sendo forjado num processo e num ambiente político que exigia a
interação entre a tarefa de elaborá-lo com as lutas travadas pelo
povo contra a Ditadura, seus esbirros, seus defensores e suas
políticas. Daí decorre um estaqueamento alicerçante do PT: o
Protagonismo. A ideia de que a Política pode e só é transformadora
à medida em que o povo for sujeito e não objeto dela.
O Partido já nasce
afirmando a Democracia não como tática ou estratégica, mas como
objetivo permanente. O ser humano é um ser político e se não se
realizar nessa dimensão é um ser incompleto. Entenda-se a Política
não uma profissão, um mandato, um cargo (estes são missões
importantes porém passageiras) mas o exercício pleno da cidadania
baseada na interação entre as pessoas, podendo formar associações,
entidades, partidos, etc, na busca da construção solidária do Bem
Comum. Maquiavel e Sun Tzu estão entre muitos que pensam diferente.
A Ética da Política é, portanto, a construção do Bem Comum com o
protagonismo das pessoas.
Nos seus 35 anos de
vida, o PT vem perseguindo realizar na prática essa concepção de
Política. O Orçamento Participativo é o exemplo seminal mais
emblemático dessa busca permanente. A participação direta da
cidadania na construção da proposta orçamentária – uma peça
essencialmente política – na integridade da sua Receita &
Despesa, antes de ser remetida para o Poder Legislativo que a debate
e a aperfeiçoa (ou não), tornando-a Lei. O OP, portanto, é um
processo possibilitador, através da apropriação do conhecimento de
como funciona a máquina pública, de empoderamento da cidadania e de
ampliação do controle público sobre o Estado ( nas três
dimensões), sobre os governos e os governantes, atacando, na origem,
qualquer esquema de corrupção. Seja por conjunturas políticas,
razões culturais, governabilidade, alianças, etc, o certo é que
não radicalizamos e nem espraiamos o suficiente essa experiência
democrática no universo de nossos governos, nem mesmo no trato do
orçamento partidário.
O OP é uma referência
mundial, mas praticamos um simulacro do que ele se propunha
originalmente como conquista da cidadania e não “obra do PT”. As
experiências do OP, na dimensão federada, são mínimas ou
inexistentes. Nossos governos não tiveram gana nem condições
políticas, por razões óbvias (as dimensões do país, a
burocracia, a logística, a necessidade da construção de uma
cultura participativa na maioria dos municípios e unidades
federativas) de implementar o OP na dimensão federal. Houve ensaios
importantes mas limitados a algumas regiões, com participação de
entidades de representação nacional, voltadas à temas e não “ao
conjunto da obra”; conferências temáticas, eleições de
Conselhos que a Presidenta Dilma, ultimamente, pretendia reforçar
através de um decreto definindo o Plano Nacional de Participação
Social, agora em disputa na Câmara via um projeto de lei. O certo é
que a feitura do orçamento público continua sendo um mistério, uma
alquimia tecno burocrática sobre cuja execução os grupos poderosos
têm maior influência do que o povo.
Vejam agora a manobra
do Orçamento Impositivo, aprovado na Câmara, que estilhaça uma
parcela considerável do orçamento da União em emendas
parlamentares que vão reforçar o clientelismo político e os
currais eleitorais. Isso tudo e mais um pouco, sublinha o quão
distante estamos de um efetivo e democrático controle público sobre
o Estado (nos cursos de formação é sempre bom esclarecer que o
Estado não é só o Executivo, mas também os demais Poderes)
brasileiro. Sublinhe-se a importância do MP como conquista
republicana da Constituinte de 88 e que merece ser reforçado e não
enfraquecido. O controle público sobre o Estado de Direito
Democrático não é uma questão de vontade de fazer ou não fazer,
que possa ser resolvida por decreto ou qualquer impostura. Essa é
uma conquista a ser obtida através de um processo de permanente,
pacienciosa e persistente, provocação ao protagonismo político,
uma construção inclusive cultural. Portanto, de longo prazo, que
precisa de partidos políticos (respeitada a pluralidade e a
diversidade) de corte diferenciado, como nasceu o PT, com vínculos
reais e não hegemonista e/ou utilitarista com os movimentos sociais
e comprometidos com a radicalidade democrática e com um Projeto de
Nação que poderia vir a ser um projeto de poder solidário,
socialista e democrático, não fosse as condutas condenáveis dos
que, já na subida, colocaram “a carreta adiante dos bois”.
Cabe uma reflexão
sobre as estruturas que se foram cristalizando no interior do
Partido: os mandatos legislativos e executivos se sobrepondo às
instâncias partidárias; as correntes internas não mais respondendo
a necessidade do debate de temas sempre atuais como, o Brasil na
América Latina e no Mundo, o Socialismo, o Capitalismo, o Estado, a
vida no seu lato sentido, a C & T, a mãe Natureza, a
Cultura. Evidentemente que, nessa conjuntura, a partir da
internacional, com o ressurgimento de ideologias que já ocasionaram
grandes guerras, progroms, culags, campos de extermínio e, hoje, de
formas diferenciadas, mais tecnológicas e sofisticadas, promovem
guerras localizadas, sustentam ditaduras, instigam conflitos étnicos
e religiosos, mantém campos de concentração e de torturas fora do
alcance da Justiça e dos Direitos Humanos, e manejam instrumentos
macroeconômicos que submetem nações, países e continentes à
Banca internacional e à megaempresas que lhes sugam as riquezas,
roubam-lhes a identidade, arrasam o meio ambiente, geram fome e
miséria, não é razoável imitarmos o caramujo ou a avestruz diante
de tais ameaças e perigos.
Estamos sobre ataque
cerrado da direita e do neoliberalismo não apenas caboclo, mas dos
seus comandos internacionais. A cereja no bolo desses ataques veio de
atitudes de figuras importantes do nosso Partido e com funções
destacadas nos nossos governos que cometeram erros sérios de
condução política, em nome do Partido e se relacionaram
pessoalmente de forma promiscua com contraventores e ladravazes de
colarinho branco, ferindo fundo a imagem e a respeitabilidade do PT,
dentro e fora do país. Essas condutas foram e são graves e o PT não
pode tergiversar em torno delas. Sem ser juiz, promotor e carcereiro
e enfrentando a insídia da Mídia monopolista local, regional e
nacional, não podemos deixar de afirmar que os que se conduziram
dessa forma não tiveram e não têm a concordância e a chancela de
qualquer instância do Partido e que queremos que sejam julgados pelo
Judiciário e não pela Imprensa. Punidos, que o Poder Público seja
ressarcido plena e totalmente dos valores comprovadamente desviados.
O filiado do PT,
principalmente o que não está empregado na estrutura partidária e
ou nos gabinetes executivos e legislativos, é instado todos os dias
a se posicionar diante de questionamentos e provocações de toda
ordem vindos de adversários ideológicos mas, também, de uma
cidadania que nos tinha como referência da boa política e hoje,
perplexa, nos vê com decepção e desesperança, sobre condutas de
dirigentes tomadas fora do alcance da sua militância e ao arrepio da
ética da política do PT. Ocorre que essas condutas não aconteceram
por acaso.
O Partido vem, de
longe, sofrendo uma transformação por conta de sua inserção de
corpo inteiro na institucionalidade. Antes, o PT se autossustentava,
à medida que foi conquistando, pelo voto e pela expressão de suas
candidaturas, mais presença nos legislativos e executivos, passou a
depender dos recursos de gabinetes e um grande número de pessoas aí
colocadas não contribuem financeiramente para o Partido nem
participam ativamente de suas instâncias. Há uma cultura de
acomodação e de pragmatismo se alastrando pelas engrenagens do
Partido como uma ferrugem. Uma derrota eleitoral para o projeto
adversário, ou, até mesmo uma alternância num governo petista, é
um Deus nos acuda na disputa por novas colocações. Nada contra o
Partido ter sofrido transformações nesses seus 35 anos de história.
Nesse período perdeu e ganhou eleições, elegeu prefeitos,
governadores e, por 4 vezes, a Presidência da República, formou
bancadas legislativas nos três níveis, fez e desfez alianças e
coligações. Algumas dessas transformações estão, no entanto, nos
empurrando aos poucos para a vala comum dos partidos convencionais. O
PT ao surgir inaugurou um novo tempo na política brasileira. Nos
governos que encabeçou o povo brasileiro conquistou cidadania junto
com mais emprego com carteira assinada, geração de renda, educação,
saúde, moradia, diminuição da miséria (saiu do mapa da fome da
ONU), da mortalidade infantil, do analfabetismo, aumento da
longevidade, do financiamento para a agricultura familiar e o
empreendedorismo; investimentos pesados na infraestrutura do país;
política externa independente, soberana, inclusiva, participativa e
construtora de uma cultura de Paz; combate às exclusões,
discriminações e preconceitos de qualquer espécie. Não é pouco,
mas falta ainda muito para o Brasil se tornar verdadeira nação para
o seu povo.
A maior riqueza do PT,
na verdade, são seus milhares de filiados/militantes que o têm como
ferramenta de transformação e não de acomodação; ferramenta que
não pode enferrujar, perder o fio nem ficar frouxa em suas mãos;
que se mobilizam nas ruas por uma Reforma Política de verdade, não
o ornitorrinco que está quebrando a casca no ninho da maioria no
Congresso, mas a que virá por pressão legítima e democrática da
cidadania despertada e com a qual poderemos construir parcerias
verdadeiras em torno de um Projeto de Nação com partidos de
contornos programáticos e ideológicos claros. A direita tenta
surfar sobre as águas turvas da corrupção, mas dos seus quadros
poucos se salvam com moral e autoridade para nos atacar. O maior erro
dos petistas que causaram esse estrago à Política e ao Partido foi
o terem se metido em enredos nos quais os partidos tradicionais da
elite patrimonialista brasileira são escolados e mestres há muito
tempo. Agora eles se acham “melhor do que nós” e, diante do
desgaste do PT e do Governo, retomam suas bandeiras de privatização
do Estado e achicamento da Petrobras, políticas que o povo rejeitou
ao nos eleger por quatro mandatos sucessivos. Querem entregar as
riquezas a serem extraídas do pré-sal às petrolíferas
internacionais através de concessões e não mais pela partilha como
conseguimos, em nossos governos, assegurar por Lei. Os ataques se
redobram às políticas que em nossos 12 anos de governo já
implementamos, afirmando o papel imprescindível do Estado na
emulação de um desenvolvimento sustentável, redutor das
desigualdades regionais, valorizador do trabalho e da distribuição
mais equitativa da riqueza por ele produzida, onde empresas como a
PETROBRAS, o BANCO DO BRASIL, a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e o BNDES
são estratégicas.
As forças políticas,
sociais e econômicas que se contrapõem ao projeto que defendemos e
que, mesmo em conjunturas e correlações de forças adversas por
conta de nosso compromisso com a classe trabalhadora e os mais pobres
do Brasil, estamos executando, agora, com “os erros do PT” (e
eles aconteceram), se acham “por cima da carne seca” e se
preparam para obstaculizá-lo nas eleições de 2018. Na verdade,
através dessas coligações espúrias, garantidas nas Leis, e as
composições de governos delas decorrentes, incorporando no
Executivo “técnicos”, “bruxos” e “experts” do campo
adversário, essas forças nos estão piranhando há muito tempo.
Nessa situação, o campo de luta do Partido não pode ser o
exclusivamente eleitoral. Daí que articulações serôdias,
paralelas às instâncias partidárias e em torno de pessoas buscando
prováveis candidaturas, é um grande equívoco e um desperdício de
energias que não reabilitam o PT. O campo de lutas é o céu aberto
da movimentação popular, com suas debilidades, contradições,
desenfoques, no seio do qual podemos educar e aprender fortalecendo a
organização popular e aglutinando forças para que, de baixo para
cima, cresça a pressão sobre os governos, legislativos e
judiciários, nos três níveis, em contraponto à pressão que sobre
eles é exercida, de cima para baixo, pelos grandes grupos de
interesse privado, seus lobistas e representantes.
Os neoliberais querem
uma democracia sem povo, nós queremos o povo protagonista,
exercitando plenamente a cidadania na defesa dos direitos
individuais, coletivos e solidários e de reformas estruturantes que
possibilitem o país se desenvolver de forma parelha, solidária e
descentralizada e que a Democracia se consolide, além do discurso e
do texto legal, na vida de milhões de brasileiros.
Por reformas: Agrária,
Urbana, Tributária e Política.
A luta não é pequena
mas é por isso que vale a pena!
Olívio O. Dutra
Presidente de Honra do
PT/RS
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