2 de nov. de 2010

Mesmo sem Nordeste, Dilma se elegeria presidente

Depois de uma das campanhas mais acirradas à Presidência da República, a ex-ministra Dilma Rousseff, de 62 anos, se consagrou neste domingo (31) como a primeira mulher a governar o Brasil. A candidata da coligação Para o Brasil Seguir Mudando conseguiu ampliar seu colchão de votos no Nordeste e no Amazonas, além de melhorar seu desempenho em Minas Gerais e no Rio de Janeiro, segundo e terceiro colégios eleitorais do país.

A conjunção desses fatores assegurou sua folgada eleição. Dilma venceu no Distrito Federal e em 15 estados – a maioria no eixo Norte-Nordeste. Já José Serra (PSDB) virou a eleição em três estados em relação ao primeiro turno — Rio Grande do Sul, Goiás e Espírito Santo — e obteve maioria de votos em 11 unidades da federação, concentrados no Sul e no Centro-Oeste, além de São Paulo.

Era esperada uma alta abstenção, devido ao feriado de Finados e ao término antecipado das corridas estaduais. Apenas 14% do eleitorado nacional, em oito estados e no Distrito Federal, precisaram voltar às urnas para definir o governador – o que contribuiu para uma menor mobilização no segundo turno.

O percentual de eleitores que deixaram de votar foi de 21,39%, entre os 135.804.433 que estavam aptos. A abstenção no primeiro turno, como de costume, foi mais baixa, 18,12%. Em relação aos últimos segundos turnos, a ausência foi maior. Em 2006, foi de 18,99%, e, em 2002, de 20,47%. Neste segundo turno, porém, os votos nulos e em branco – que foram respectivamente de 5,51% e 3,13% em 3 de outubro – caíram para 4,40% e 2,31%.

Com 100% das seções apuradas, Dilma amealhou 55.752.508 de votos (56,05% do total de votos válidos) contra 43.711.350 (43,95%) de José Serra (PSDB). A expressiva vantagem da petista para o tucano – de pouco mais de 12 milhões de votos – ocorreu graças, sobretudo, à sua enorme votação nos estados do Nordeste.

Na região, consolidada como maior reduto eleitoral dos partidos de esquerda, a candidata teve 10,7 milhões de votos a mais que Serra. Mesmo se o Nordeste fosse excluído dos cálculos, Dilma venceria a eleição por um saldo superior a 1,3 milhão de votos – ou 0,9 ponto percentual (50,9% a 49,1%).

Serra não arrasa em SP

Uma mostra das dificuldades da oposição neste pleito foi o resultado final em São Paulo – maior colégio eleitoral do país. No estado governado pelo PSDB há 16 anos e por Serra até abril, a campanha tucana esperava abrir 3 milhões de votos a favor de Serra, para fazer frente ao massacre eleitoral no Nordeste.

Mas os paulistas não corresponderam tanto. No primeiro turno, o tucano venceu Dilma no estado por 40,66% a 37,31%, ao passo que Marina alcançou 20,77%. Já em 31 de outubro, Serra ganhou de 54,1% a 45,9% – uma vantagem de “apenas” 1,8 milhão de votos.

No Paraná e em Santa Catarina, Serra amealhou cerca de 1,1 milhão de votos a mais que Dilma. Foi apenas somando a votação nesses dois estados e em São Paulo que o tucano extraiu tal vantagem de quase 3 milhões de votos.

Nos outros oito estados vencidos pelo candidato do PSDB, o colégio eleitoral era pequeno ou o tucano teve vantagem reduzida – como no Rio Grande do Sul, onde o placar de 51% a 49% significou pouco mais de 100 mil votos de vantagem. Na soma desses 11 estados mais serristas que dilmistas, Serra abriu vantagem de quase 3,5 milhões de votos.

Os trunfos de Dilma

Dilma recuperou essa desvantagem e ainda pôs a diferença de 12 milhões de votos do resultado final ao obter votações maciças no Nordeste, no Amazonas, em Minas Gerais e no Rio de Janeiro. Em Minas, a candidata abriu uma dianteira de 1,7 milhão de votos, praticamente anulando a vantagem que Serra obteve em São Paulo.

Depois de vencer no estado por uma margem folgada (46,98% a 30,76%) em 3 de outubro, Dilma obteve 58,4% dos votos (6,2 milhões) na terra de Aécio Neves no segundo turno, contra 41,5% (4,4 milhões) de Serra. A performance do tucano foi 33% melhor (mais 1,1 milhão de votos) e a de Dilma, 22% (mais 1,15 milhão). Mas a diferença manteve-se no mesmo patamar, entre 16 e 17 pontos.

No Rio de Janeiro, terceiro maior colégio eleitoral, o tucano, com 22,53%, ficara em terceiro no primeiro turno, atrás dos 31,52% de Marina Silva. Subiu 17 pontos percentuais, para 39,5% (3,2 milhões). Mas Dilma avançou praticamente o mesmo índice – 16,74 pontos –, indo de 43,76% a 60,5% (4,9 milhões).

No eleitorado fluminense, ela se aproximou do governador Sérgio Cabral (PMDB) – que se reelegeu com 66% dos votos válidos no primeiro turno. Mais do que isso, só com o resultado do Rio e de Minas, Dilma compensou a desvantagem nos 11 estados perdidos para Serra.

O lucro veio do Amazonas e do Nordeste, onde a petista alcançou votações arrasadoras. No Maranhão, Dilma teve seu maior percentual da região (79,09%), seguido por Ceará (77,35%), Pernambuco (75,65%) e Bahia (70,85%). Nestes quatro Estados, Dilma pôs uma vantagem de 9 milhões de votos sobre o adversário.

O estado onde a futura presidente alcançou o seu melhor desempenho percentual foi o Amazonas, com 80,57% (o que significou 865 mil votos a mais que Serra). O melhor desempenho do tucano foi no Acre, com 69,69%. O Distrito Federal, única unidade da Federação vencida por Marina Silva no primeiro turno, foi conquistada desta vez por Dilma.
Fonte: http://www.vermelho.org.br/

#ESTUPIDEZ


Uma declaração preconceituosa e baseada em dados imprecisos postada no Twitter por uma estudante de direito de São Paulo causou grande polêmica nas redes sociais. A aluna atribuiu aos nordestinos a derrota de José Serra (PSDB) nas eleições presidenciais. O embate regionalista tomou conta das discussões no microblog, com reações imediatas contra a infeliz frase e também com comentários de moradores das regiões Sul e Sudeste.

"Nordestisto (sic) não é gente. Faça um favor a SP: mate um nordestino afogado!", escreveu a estudante, durante a madrugada. Ela também usou o Facebook para mostrar a indignação com a vitória de Dilma Rousseff (PT) e culpar o povo do Nordeste pela derrota. "Afunda Brasil. Deem direito de voto pros nordestinos e afundem o país de quem trabalha pra sustentar vagabundos que fazem filhos pra ganhar o bolsa 171", postou.

O comentário repercutiu tanto, que, ao meio-dia de ontem, o hashtag #nordestisto - escrita de forma incorreta pela estudante - passou a ser a terceira palavra mais comentada pelos usuários do microblog. A guerra regional fez outros termos serem mais acessados ainda: "orgulhodesernordestino" e "norte/nordeste e sul/sudeste". Quando o caso começou a repercutir, a estudante publicou mensagens se desculpando. Mais tarde, cancelou seus perfis.

As declarações preconceituosas podem resultar na prisão dos autores das frases. De acordo com a legislação brasileira, crimes contra a procedência nacional preveem pena de até três anos. Um jurista ouvido pela reportagem explicou que as redes sociais são consideradas meios de comunicação. "Qualquer informação ofensiva à honra ou preconceituosa é suscetível de apuração e apenação, como em qualquer outro veículo de comunicação", explicou.

Já o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB), lembrou que há um preconceito muito forte contra o Nordeste em estados das regiões Sul e Sudeste. "A pessoa deveria procurar outras razões para a derrota do Serra, porque, no Brasil, o voto de cada umtem peso igual. Se a eleição brasileira fosse como nos Estados Unidos, onde os votos são divididos por estado, de acordo com o número de delegados, aí sim poderia se atribuir a derrota a um estado, mas jamais com o uso do proconceito", comparou o cientista.

A polêmica foi criada a partir de uma falsa ideia de que os votos da região Nordeste teriam sido os responsáveis pela eleição de Dilma. Levantamento feito pelo Diario/Correio Braziliense, com base nos resultados divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mostra que a candidata do PT venceria o pleito mesmo que fossem considerados apenas os votos das regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Norte. No cenário em que os votos do Nordeste não são contabilizados, Dilma ficaria com 1,3 milhão de votos a mais que Serra. Até mesmo se fossem contabilizados somente os votos do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, a petista sairia vencedora, com cerca de 300 mil votos à frente do tucano.

Embora a presidente eleita tenha sido superada pelo adversário em São Paulo, o maior colégio eleitoral do país, ela venceu no segundo e terceiro estados de maior eleitorado, Minas Gerais e Rio de Janeiro, respectivamente. No Nordeste, Dilma superou Serra em mais de 10 milhões de votos. Na contagem oficial do TSE, ela atingiu 12 milhões de votos a mais que o concorrente em todo o país.

ARTIGO: A imprensa perdeu


Por Luciano Martins Costa em 1/11/2010 - 
OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA

Os principais jornais do país anunciam a vitória da candidata petista Dilma Rousseff como a última obra do presidente Lula da Silva. 

O Estado de S.Paulo é o mais explícito: "A vitória de Lula", diz a manchete. O Globo se arrisca em adivinhações: "Lula elege Dilma e aliados já articulam sua volta em 2014", diz o jornal carioca. A intenção é claramente minimizar o cacife político da presidente eleita. Já a Folha de S.Paulo destaca o fato de o Brasil ter escolhido a primeira mulher "e primeira ex-guerrilheira" para a Presidência da República.

Lendo as edições do domingo e de segunda-feira (1/11), alguém que estivesse desembarcando no Brasil depois de três meses de viagem nem chegaria a desconfiar que a imprensa havia sido, até a véspera, protagonista das mais ativas na campanha eleitoral.

Desejo manifesto Os jornais inauguram a semana pós-eleitoral com cara de jornais, não dos panfletos em que se transformaram nos últimos meses. Cada um conforme seus recursos, os diários tentam interpretar a vontade das urnas e adivinhar o que virá a ser o futuro governo. No entanto, alguns pontos em comum podem ser ressaltados.

A chamada grande imprensa procura afirmar que a oposição, apesar de derrotada na eleição principal, cresceu em número de eleitores, mesmo perdendo na maioria dos estados. A maioria feita pela candidata governista no Congresso Nacional seria equilibrada pela eleição de governadores oposicionistas nos estados mais populosos, segundo interpretam os jornais.
Como sempre, o viés ideológico direciona as escolhas da imprensa, que perdeu a disposição para arriscar opiniões fora da sua própria caixinha de convicções. Basta lembrar como foi a manada de adesões ao governo central nas duas eleições do presidente Lula da Silva para colocar em dúvida as afirmações dos jornais sobre a suposta solidez do bloco oposicionista.
Com o histórico do adesismo que marca a República desde a redemocratização, parece arriscado demais apostar em configurações de forças políticas com base no resultado quente das urnas. No caso, essas análises representam muito mais a manifestação dos desejos da imprensa, de não parecer assim tão derrotada pela realidade da votação, do que a expressão de uma visão realista do resultado eleitoral.

Dissimulando a derrota Os jornais citam o desgaste que foi produzido nas bases da oposição por conta de divergências entre o candidato derrotado José Serra e o senador eleito de Minas Gerais Aécio Neves, considerado por analistas do próprio PSDB como o grande trunfo desperdiçado pela campanha oposicionista.

Sobram indícios de que os dois personagens criaram um fosso intransponível entre si, e que daqui para frente a consolidação da carreira de Aécio Neves implica a diminuição do papel a ser exercido por Serra.
Some-se a isso o fato de que Serra também tem divergências com o governador eleito de São Paulo, Geraldo Alckmin, para se construir uma análise muito menos animadora sobre o seu futuro como líder da oposição. Além disso, ainda resta dentro do armário o esqueleto do suposto dossiê que teria sido montado no período da escolha do candidato do PSDB, e que teve como objetos de bisbilhotices pessoas ligadas a José Serra.
Serra perdeu em Minas Gerais e ninguém sabe quanto desses votos foram para a candidata oposicionista como vingança dos mineiros pela maneira como ele passou por cima das ambições políticas de Aécio Neves.
A imprensa também destaca que o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, anda fazendo planos para se descolar de seus padrinhos políticos e prepara o lançamento de um novo partido, montado com os restos da liderança do peemedebista Orestes Quércia no estado.

Assim, em poucas linhas, pode-se observar que os principais jornais do país, que tiveram praticamente todo o final de semana para preparar suas análises pós-eleitorais, perderam a oportunidade de surpreender o eleitor explorando as amplas possibilidades que se armam nas relações políticas com a vitória de uma candidata que nunca havia disputado uma eleição, cuja biografia tinha tudo para reduzir suas chances de vitória – dado o conhecido conservadorismo da imprensa e de grande parte do eleitorado – e que foi vítima de uma campanha sórdida e preconceituosa.

Não há como dissimular o papel da imprensa tradicional no jogo sujo que termina. Também fica difícil disfarçar o ressentimento da imprensa com o resultado das urnas. Não há análise, por mais que se pretenda distanciada, que esconda o fato de que a imprensa tradicional foi fragorosamente derrotada nestas eleições.