Estimado Luis  Nassif,
tenho lido com alguma frequência seus artigos e  cumprimento por sua clareza, determinação e coragem. Vi um comentário  recente (em  http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2010/03/28/sobre-manifestacoes-e-estrategias-politicas/  ), que faz referência a declarações que eu teria dado ao Zero Hora, de  Porto Alegre, fazendo uma suposta autocrítica sobre as ocupações de  terra.
Infelizmente, o jornalista charlatão me fez uma longa  entrevista de mais de uma hora, e depois editou de acordo com os  interesses de seus patrões. Mas gostaria de esclarecer o sentido das  minhas respostas para você e seus leitores.
No atual período  histórico, disse e reafirmo, não está mais em disputa apenas os  interesses dos pobres sem-terra e dos latifundiários, que se apropriaram  de grandes extensões de terras públicas mantidas ociosas como reserva  de valor.
Estamos num novo período histórico, determinado pelo  avanço do capitalismo internacional e financeiro sobre a agricultura  brasileira, que leva a uma disputa entre dois projetos socioeconômicos  para organizar a produção agrícola.
De um lado, os latifundiários  “modernizados” (em geral, propriedades acima de 500 hectares), que  construíram uma aliança com as empresas transnacionais, fornecedoras de  insumos, sementes e compradoras da produção. Dessa forma, impõem o preço  e controlam o mercado externo, a quem se destinam as chamadas  commodities.
Esse modelo se chama de agronegócio, que se  caracteriza pela necessidade de concentrar a propriedade da terra para  aumentar cada vez mais a sua escala.
Expulsa o povo do interior  para as grandes cidades, porque não oferece oportunidades de trabalho  suficientes aos trabalhadores rurais.
É agressor do ambiente,  pois o monocultivo destrói todas as outras formas de vida vegetal e  animal, e só consegue produzir com elevado uso de venenos agrícolas. Daí  porque o Brasil se transformou no maior consumidor mundial de  agrotóxicos do mundo – que são, aliás, produzidos por empresas  transnacionais.
Do outro lado, temos a agricultura familiar, que  prioriza o mercado interno, com a produção de alimentos sadios, por meio  de práticas agrícolas em equilíbrio com a natureza, com agricultura  diversificada e que demanda muita mão-de-obra.
No outro ciclo  histórico, a ocupação de terras era a principal forma de luta. Era  suficiente para enfrentar o latifúndio e abrir um processo de  democratização da propriedade da terra. E foi com essa prática que o MST  nasceu.
Agora a ocupação de terras é insuficiente para enfrentar  o modelo do agronegócio. Por isso, além das ocupações, o MST deve  desenvolver novas formas de luta, que envolvam todos os camponeses e  outros setores da sociedade interessados em mudar esse modelo de  exploração agrícola, que agride o ambiente e produz alimentos  contaminados.
Ou seja, nas regiões do país em que ainda existem  muitos latifúndios improdutivos e trabalhadores sem-terra, certamente a  ocupação continuará sendo a principal forma de luta – que vem  acontecendo, inclusive, independente da existência do MST -,  implementada por diversos movimentos sociais ou como reação à pobreza de  comunidades rurais.
No geral, além das ocupações, devemos  desenvolver novas formas de luta, para conscientizar a sociedade das  perversidades do agronegócio e suas conseqüências para o nosso povo e  para toda a sociedade.
Certo de sua atenção, receba um forte  abraço